sábado, 4 de outubro de 2008

Transcrição da íntegra da entrevista exclusiva concedida pelo Prêmio Nobel da Paz Muhammad Yunnus para o programa Cidades e Soluções sobre microcrédit

O repórter Carlos de Lannoy conversou com Yunnus em Brasília.
MUHAMMAD YUNNUS, Premio Nobel da Paz 2006. Conhecido como “o banqueiro dos pobres”, o economista bengalês foi o criador do conceito de microcrédito quando fundou, em 1976, um pequeno banco que se propunha a oferecer acesso ao crédito para os mais pobres, o banco Grameen.
Carlos de Lannoy - Sr. Yunnus, como o senhor teve a idéia de emprestar dinheiro para os cidadãos menos privilegiados?
Muhammad Yunnus - Surgiu das condições extremas que enfrentávamos em Bangladesh no início dos anos 70. Tínhamos a fome no país e eu estava me sentindo inútil por não poder fazer nada pelas pessoas que estavam sofrendo. Então, tentei ajudar as pessoas na vila próxima ao campus da universidade onde eu lecionava. Fiz várias pequenas coisas, e vi agiotas usando essas pessoas pobres para enriquecer. Pensei que se eu mesmo desse o dinheiro - em vez dos agiotas - e não impusesse condições tão difíceis, resolveria o problema. Então, emprestei US$27 a 42 pessoas e todos ficaram animados. Quis promover o contato dessas pessoas com o banco que ficava no campus. O campus disse que não podia fazer isso. Depois de muita insistência, a única solução que encontrei foi me oferecer para ser o fiador. Eu disse: “Eu assino os seus papéis, vocês dão o dinheiro e eu assumo a responsabilidade. Eu assumo o risco.” Assim começou e deu certo. Nós ficamos felizes por ter funcionado e continuamos a expandir. Isso cresceu até se tornar o que chamamos agora de microcrédito. Criamos um banco, o Banco Grameen, que significa “Banco da Vila” e expandimos para toda Bangladesh.
E esse banco, o Banco Grameen, tem uma metodologia. Não é apenas dar dinheiro às pessoas pobres, com juros baixos. Quais são os métodos?
Um aspecto básico, que foi adotado de pronto, é que as pessoas não deveriam ir ao banco. O banco deveria ir até as pessoas. Todo nosso trabalho é feito na porta de quem pega o empréstimo. Lidamos com as pessoas mais pobres, mulheres pobres, particularmente. Pedimos que elas formem um grupo de 5 pessoas. Isso tornou-se parte da metodologia do Grameen: grupos de 5 pessoas. Pedimos a eles que paguem em prestações regulares, em mais prestações. Então, usamos prestações semanais. Isso também é parte da estratégia do Grameen. Fazemos empréstimos para atividades de geração de renda. Então, você investe esse dinheiro que pegou emprestado e ganha dinheiro. Com esta receita, você paga o empréstimo. Então, é basicamente assim que todo o sistema funciona.
O senhor disse que escolhe mulheres para emprestar dinheiro porque elas estão mais dispostas a investir o dinheiro na família. Como vocês chegaram a essa conclusão?
Nós dizíamos aos bancos convencionais que eles eram injustos por rejeitarem as pessoas pobres. Eles também eram injustos por rejeitarem as mulheres. Mesmo sendo uma mulher rica, eles não queriam fazer negócio com mulheres. Eu digo que nem 1% de quem pega dinheiro emprestado dos bancos convencionais são mulheres. Então, tem algo errado com o sistema! Assim, quando nós começamos, eu quis me certificar de que metade dos nossos clientes fossem mulheres. Eu queria romper com aquela política. Então, eu fui até as mulheres. E elas disseram: “Eu não sei o que fazer com o dinheiro. Dê para o meu marido.” Então, voltamos para o mesmo problema. Levamos muito tempo, cerca de seis anos, para chegar ao meio a meio: a mesma quantidade de homens e mulheres. Vimos que o dinheiro que entrava para a família através das mulheres provocava um impacto muito maior na família, levava muito mais benefícios para a família do que a mesma quantidade de dinheiro emprestada aos homens. Mulheres cuidam bem do dinheiro e, quando elas ganham mais dinheiro, pensam mais nas crianças. Mulheres têm visão de longo prazo, elas querem se desenvolver. Homens não prestam tanta atenção nessas coisas, eles são mais casuais, eles preferem aproveitar o presente em vez de se preocupar com o futuro… eles não têm tanta preocupação em favorecer o futuro das crianças, como as mães têm.
Você quer dizer que as mulheres saem-se melhor em pequenos negócios e homens são melhores em grandes negócios?
Não, eu não disse isso. Nos negócios, os dois fazem igual, mas o impacto na família é muito melhor quando a mulher é a beneficiária. Sempre que ela recebe algum dinheiro, imediatamente as crianças são beneficiadas. Mas, quando os pais recebem o mesmo dinheiro, o homem prefere se beneficiar a cuidar das crianças e a mulher tem visão de longo prazo, ela quer se desenvolver, quer sair da pobreza. Os homens querem aproveitar o presente. Então, nos negócios, os dois têm o mesmo desempenho. Mas, em relação ao impacto, há muita diferença entre o que acontece quando a mulher ou o homem recebe o empréstimo.
Estes empréstimos permitem que os países cresçam ou eles apenas ajudam os pobres a lutarem contra a miséria individualmente?
Por exemplo, se você tem metade da população do país, como em Bangladesh, abaixo da linha da pobreza, então essas pessoas não estão contribuindo para a economia porque eles não conseguem ganhar dinheiro, não conseguem produzir nada. Com o microcrédito, se você consegue transformá-los em cidadãos produtivos, eles vão produzir. Cada um vai produzir bem pouco, mas metade de uma população de 150 milhões, se cada um produz um punhado, então haverá cem… centenas de milhões de punhados que contribuirão para o PIB, que contribuirão para o crescimento da economia. Eles podem ser pequenos, mas não há motivo para que eles sejam ignorados. A contribuição de cada um deles pode ser pequena, mas eles são muitos. Então, posso dizer que eles desempenham um papel muito importante e eles transformam suas vidas. Isso é muito importante. Cada ser humano tem um potencial enorme, uma capacidade enorme. Pessoas ricas ou pobres, não importa, todos têm a mesma capacidade! Pessoas ricas têm mais oportunidades e as pessoas pobres, não. Então, se eles puderem usar seu potencial, liberar sua capacidade, seu potencial, eles podem melhorar, podem criar mais para a sociedade, contribuir mais para a sociedade do que poderiam normalmente.
Uma das lições que o senhor deu aos grandes bancos é a de que emprestar dinheiro aos pobres não é arriscado. O senhor acha que este tipo de negócio vale a pena para os grandes bancos?
Isso fica muito claro quando há uma grande crise; quando muitos bancos fazem muito dinheiro com caução e muitos advogados por trás, e eles não conseguem reaver o dinheiro. Cerca de US$ 1 trilhão. Aqui, nós estamos fazendo um sistema bancário para os pobres, sem garantias, sem caução, sem advogados, baseado na confiança. O pagamento chega perto de 100%. É de 98%, 99%. Está coberto. Então, eu diria que o microcrédito tem tido um desempenho melhor do que os bancos convencionais em termos de performance.
Aqui no Brasil temos um programa federal que empresta dinheiro para pessoas pobres, que se chama Bolsa Família. Cerca de 11 milhões de famílias recebem esse dinheiro no Brasil. O ato de emprestar dinheiro é diferente de dar o dinheiro?
Estamos falando de negócios e de caridade. Caridade é uma coisa importante e não estou minimizando a importância da caridade, mas ela faz com que as pessoas fiquem dependentes dela. Você não utiliza a sua energia, você apenas espera as coisas que serão dadas. Então, você fica dependente daquele que está te alimentando. Mas se esses US$ 100 forem emprestados, então fica a responsabilidade de usar esse dinheiro para ganhar mais, pagar o empréstimo e ainda ter algo pra você. Isso faz toda a diferença. A energia sai, a pessoa se descobre. Se você se sai bem, então não vai querer mais só US$ 100, vai querer US$ 200 agora, porque você está mais confiante, mais sábio, mais experiente e pode dar um passo à frente. Mas, se esse dinheiro vem da caridade, a pessoa fica parada ali. Muitos países ricos estão abaixo da linha do bem estar, então essas pessoas que recebem dinheiro ficam dependentes da sociedade. Eles não conseguem sair do sistema de welfare, a cabeça dessas pessoas já está acostumada a essa inércia. Elas não criam, não contribuem e não descobrem suas próprias energias..
Alguns políticos dizem que dar dinheiro é mais fácil e tira as pessoas da pobreza imediatamente. No Brasil reclama-se muito da burocracia. Que mecanismo o seu grupo desenvolveu para deixar o trabalho menos burocrático?
Quando se fala em burocracia, eu penso logo em “fazer favores”. No business não existe burocracia. Você tem um negócio. Se você não se der bem, você some, ninguém mais quer saber de você. A burocracia acontece quando você faz favores para alguém. Então, fica a seu critério fazer ou não o favor. É assim que você se torna ineficiente. Você não é responsável. Nos negócios você tem que olhar para o seu umbigo porque se não for competente você está arruinado. Seu negócio fecha. Eu diria que burocracia está associada às organizações ineficientes. Eu não acredito que isso se aplique às organizações de negócios. Nas maiores empresas do mundo ninguém reclama da burocracia.
O senhor acredita que a metodologia do Banco Grameen não gera burocracia?
É um negócio de propriedade dos mais pobres. Todo o Banco Grameen é de propriedade dos clientes.
É preciso envolver as pessoas no processo?
O que estou dizendo é que esse é um negócio diferente: ele é posse das pessoas mais pobres. Não dos mais ricos, mas dos seus próprios credores! Então, eles têm que ter certeza de que as pessoas que estão trabalhando lá estão trabalhando para os próprios empregados. Se você não trabalhar bem, então eles podem te dispensar porque eles são os proprietários do banco.
Agora que a sua metodologia é bem conhecida em todo o mundo, as pessoas imaginam a possibilidade de criar uma indústria do Banco Grameen, do microcrédito. Alguns dizem que, em vez disso, seria preciso criar um método para ajudar as pessoas a se desenvolver, ajudar as pessoas que estão mal a encontrar o seu caminho. É diferente envolver o sistema, o sistema financeiro, ou envolver as pessoas pobres diretamente?
Veja, o sistema financeiro que o mundo tem hoje nega à maioria da população o acesso a estes serviços. Quase dois terços da população mundial não têm acesso aos serviços financeiros oferecidos pelos bancos convencionais. Nós estamos tentando mudar isso, nós estamos tentando trazer os serviços financeiros para os mais pobres, de forma que quem conseguir o dinheiro possa usá-lo para trabalhar, começar a ganhar dinheiro e mudar a própria vida. Pode estar no banco de motorista da própria vida, pode fazer por ela mesma. Ela não precisa depender de ninguém. Ela tem a mesma capacidade de qualquer outra pessoa. Talvez, no começo, ela não consiga entrar em grandes negócios, mas uma empresa pequena é um oásis para ela continuar. Eu diria que isto deveria ser expandido para todos os lugares, todos os países. O sistema bancário deve ser inclusivo, ninguém pode ter acesso impedido aos serviços financeiros.
Houve algumas tentativas de trazer isso para o Brasil, por que ainda não aconteceu?
Bem, você não tem que trazer. Você tem que fazer! Ninguém vai trazer o Banco Grameen pronto para servir. É um procedimento simples, se alguém quiser fazer, pode fazer. Apenas é preciso observar, aprender, ler livros ou visitar alguns programas pelo Brasil. Há muitos programas assim em toda a América Latina. Podem-se observar estes programas em todo lugar. Então, tudo o que tem que ser feito é olhar, aprender e fazer. Algumas vezes você pode errar, não fazer direito, mas na terceira tentativa vai dar certo. Você vai estar construindo… se você fizer em um lugar pequeno, pode expandir gradativamente. Se você pode fazer negócio com 100 mulheres, ou 100 pessoas, então você pode expandir para milhares e, depois, expandir para milhões e milhões.
Há experiências bem-sucedidas de microcrédito em vários países. Qual é a fórmula do sucesso?
Fazer certo.
E é difícil fazer certo?
Não, é muito simples, é o que estou dizendo. É uma coisa muito simples.
Mas, o senhor acha que algumas pessoas não tentaram fazer o certo?
Eu acho. Se tentarem o certo, foram bem-sucedidas. Não há erro.
E é preciso ter taxas baixas de juros?
Não necessariamente. Nós não falamos sobre juros baixos, nós dizemos que tem que ser sustentável, para que você possa cobrir seus custos. Mas nós também queremos que você não use as pessoas pobres para ficar rico. Então, você não faz muito lucro, tenta manter o dinheiro com as pessoas pobres o máximo que puder. Mas, ao mesmo tempo, você recupera seu investimento. Você não subsidia nada.
Muito obrigado pela entrevista.
Muito obrigado.

2 comentários:

Jorge Ferreira Bourhaussem disse...

Cara colega Marcia, bastante interessante sua postagem sobre esse assunto. Gostei desse e de outros posts que colocaste aqui, porém gostaria de contibuir com uma informação. Não sei se é do seu conhecimento, a meneira que uma EMPRESA dirigida por uma mulher tornou-se uma grande atração dos empresários. Uma pequena empresa tipo o "Grameen", ao iniciar os seus trabalhos apostou na população com menor capital, correndo o "RISCO" em investir ou dar oportunidade a esse grupo de pessoas, no entanto se tornou um sucesso a pequena empresa da querida senhora Luiza, uma pessoa que acreditava em ajudar aos pobres mas não dando "gorjetas" e sim em investir nessas pessoas. Deu certo, poderia ficar aqui relatando toda essa cnquista da queria Luiza, mas não quero me estender muito. Minha mãe coincidentemente também chamava-se Luiza, nome forte de mulher batalhadora e de coração generoso como varias Luizas que passam no meu caminho. Enfim ajudei essa Luiza a fazer crescer seu empreendimento, como podemos chamar hoje a pequena loja da Dona Luiza, o atual MAGAZINE LUIZA, onde pude colaborar na prestação de serviços. Bem gostaria de parabenizá-la pela divulgação de assuntos como esse, pois acho fundamental ao crescimento do no BRASIL. um grande abraço. JORGE FERREIRA

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